quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

POESIA (E POETAS) HOLOSISTAS QUE NOS INSPIRAM: "SER (PÁSSARO)" de RUI MANUEL GRÁCIO NEVES


SER (PÁSSARO)

Neste Dia,
Sabiamente,
Decidi
Transformar-me num pássaro!
Acreditem,
Posso transformar-me no que quero.
Tenho esse Dom.
Basta-me ser Uno com o Cosmos.
Portanto, posso Ser pássaro
Não é verdade?

(Mas O que é “Ser”?
Ser é “sentir”.
Pensar como um pássaro,
Sonhar como um pássaro,
Procurar alimento como um pássaro,
Proteger-me como um pássaro,
Voar como um pássaro,
Escapar do Perigo
Como um pássaro).

Escolhi ser um milro.
Agora canto em qualquer árvore.
E,
Que bem que canto!
Que belos são os cantos dos Milros!
Sou livre.
Só devo comer quando preciso.
Mas devo ter cuidado:
São perigosos os seres humanos.
Mais do que qualquer outro ser!

De repente,
Voluntariamente,
Mudei para Gaivota.
Gosto mais!
Estou mais em companhia.
Não tão sozinho.
Porque,
Às vezes,
A gente aborrece-se mesmo de estar sozinho.
E
Esvoaço perto do Porto de Lisboa.
Posso ter outras amigas.
Tento agarrar algum peixe.
Mas agora,
Neste dia,
Não estou
Realmente
A ter lá muita sorte.
(Alguma coisa
Deve falhar
No meu Sonho!)

Há vento.
E Sol.
Quase não mexo as asas.
Calculo.
Sou um Mestre em Geodinâmica.
E em Física do Espaço.
Passo rente à água do Mar.
Merda!
Escapou-se-me outro!
Mas sinto-me bem.
Sinto-me livre.
Posso levantar voo,
De Novo.
Volto a Ser,
De Novo.

E
Vejo seres humanos lá em baixo,
Pequeninos,
Pequeninos.
E
Observo as pequenas ondas,
Brancas,
A esmorecer.
Não há quase praia.
Ai,
Estes seres inhumanos acabam realmente com tudo!
Já quase nem há peixes!
Só o óleo dos barcos.
E contaminação.
E mais smog.
Restam poucos peixes nesta zona.
E tenho que comer!

Mas sinto-me feliz.
Vou para cima das pedras,
Lá nas docas.
Esfrego o bico no corpo.
E limpo-me.
Coço-me.
O Sol está forte.

E,
Lá “em cima”,
Está Deus,
A Grande Gaivota,
Que nos dá a comida
Nossa de cada dia.
“O peixe nosso de cada dia
Dai-nos hoje”,
Quando dele precisamos,
Ensinou-me a Minha Mãe
Quando eu era mais pequeno.

Ao longe,
Os apitos de um barco.
Há vários barcos.
E
Hoje há até
Um grande transatlântico
No Porto de Lisboa.
Quantas janelas!

Para onde irão tantos seres humanos,
Metidos naquelas janelas?
São tão prisioneiros os seres humanos!
Eu não queria Ser mesmo um ser humano!
Não podem voar.
Não são livres.
São tão escravos!

Mas eu sou um ser humano também!
Perdão,
Sou uma Gaivota.
Perdão,
Sou as duas coisas!
Qual a diferença?
E posso ser muito mais...
É só querer!

Se quiser,
Posso ser livre.
É só querer!
Querer é poder.
Não é preciso Dinheiro.
Nem Poder político.
Essas coisas só atrapalham a vida de uma Pessoa...
Muito mais uma Gaivota.
Para que há-de querer
Dinheiro ou Poder
Uma Gaivota?

De todas as formas,
Interrogo-me
Frequentemente:
Mas porque é que
Tão poucos seres humanos
Querem ser livres
de verdade?

Eis a Grande Pergunta,
O Grande Ko’an:
“O que é,
Em definitivo,
Ser-se Livre?”
Há alguém
Que se atreva
A responder?
Não com uma abstração
(Não compreendo abstracções),
Não com uma resposta
Pré-fabricada,
Mecânica,
Artificial,
Aprendida de Memória,
Nos Livros:
Falsa,
Portanto.

Sim,
Quem pode responder
A esta pergunta
Com a própria Vida?
“Eu”,
A
Gaivota
Que
É
Todas
As
Coisas!

RUI MANUEL GRÁCIO NEVES

Sem comentários:

Enviar um comentário